SANTIAGO, A HISTÓRIA DE UM PESCADOR

Quando despertou naquela manhã, Tiago, filho de Zebedeu e Salomé jamais poderia imaginar a mudança que estava por vir, afinal parecia um dia como outro qualquer na praia de Betsaida na Galileia, mas foi exatamente nesse local que tudo mudou.

Tiago e seu irmão João eram pescadores e consertavam a rede quando Jesus apareceu e ordenou que eles lançassem a rede ao mar. Para assombro de todos, quando eles arrastaram a rede se depararam com uma enorme quantidade de peixes. Tiago e João ficaram tão admirados com esse milagre que decidiram largar tudo e seguir Jesus.

Um pouco mais tarde os irmãos foram escolhidos pelo próprio Jesus para serem seus apóstolos. O temperamento forte e impulsivo de Tiago e João se manifestava quando eles encontravam com a indiferença daqueles que rejeitavam os ensinamentos de Jesus, provavelmente por isso Ele os apelidou de “filhos do trovão”.

O tempo passou e o então apóstolo Tiago tornou-se muito próximo de Cristo, sendo um dos poucos que presenciou a transfiguração de Jesus, a agonia no Getsêmani, além de diversos outros milagres.

O apóstolo Tiago na Galícia.

Após a morte do seu mestre, o apóstolo Tiago foi para a região onde hoje é a Galícia, na Espanha, com objetivo de disseminar os ensinamentos de Jesus, conforme Ele mesmo havia orientado. O apóstolo fez a viagem de barco partindo de Jerusalém e chegando à Finis Terrae (Finisterre), local onde de fato acreditava-se que era o final da terra. Entretanto, parece que Tiago não teve muito êxito na região, até então povoada pelos celtas que eram mais naturalistas, cultuavam o sol, as estrelas, o mar, os rios, etc.

Em 44 D.C desapontado com o seu insucesso, o apóstolo Tiago decidiu voltar a Jerusalém para celebrar a Páscoa, chegando lá foi preso e decapitado por ordens do rei Herodes Agripa I, neto do outo Herodes que era rei na época que Jesus nasceu, a ideia era intimidar os cristãos, mas a estratégia não deu muito certo, e a palavra do mestre só se multiplicava.

Herodes Agripa mandou jogar o corpo do apóstolo Tiago no pasto para os cachorros comerem, mas Atanásio e Teodoro, que eram discípulos fiéis de Tiago, recolheram os seus restos mortais, colocaram dentro de uma pesadíssima arca de pedra e levaram de barco para ser enterrado na Galícia em Iria Flávia, hoje Pardón. Chegando lá pediram permissão para enterrar o corpo do apóstolo nas terras da rainha Lupa que governava essa região.

A conversão da rainha pagã.

Lupa era pagã e diante do pedido achou mais divertido dificultar do que simplesmente negar, por isso cedeu dois touros selvagens para transportar o corpo do apóstolo, acreditando que essa seria uma tarefa impossível de se realizar, entretanto, os dois animais tornaram-se mansos e domesticados milagrosamente. Diante desse acontecimento, a rainha permitiu que o apóstolo fosse enterrado em suas terras sem maiores transtornos e se converteu ao cristianismo.

Teodoro e Anastásio cuidaram do túmulo de Santiago até que ambos morreram e foram enterrados ali mesmo ao lado de seu mestre. Com o tempo, todos esses acontecimentos, assim como os túmulos, foram esquecidos.

O Campus Stellae

Foi só no ano de 813 que o ermitão Pelágio viu uma chuva de estrelas lá pelas bandas do bosque Libredón. O ermitão foi até o bispo da região, Teodomiro, relatou o ocorrido e imediatamente todos se dirigiram para o local indicado e lá encontraram as ruínas das 3 tumbas.

Assim que soube da descoberta, o rei Afonso II foi até o túmulo do apóstolo, tornando-se assim o primeiro peregrino a fazer o Caminho até Santiago, o percurso feito por ele é o que conhecemos como Caminho Primitivo. Este rei, ordenou a construção de uma capela no local que ficou conhecido como Campus Stellae (Campo de Estrelas), hoje Santiago de Compostela.

A notícia se espalhou rapidamente por toda a Europa, surgiram vários milagres atribuídos a Tiago, e o apóstolo passou a ser chamado de Santiago. Milhares de pessoas começaram a peregrinar até o tumulo do apóstolo, dando origem aos diversos Caminhos de Santiago. De repente a capela ficou pequena demais diante da grandiosidade desse apóstolo, e em 1075 iniciou-se a construção da magnífica catedral que recebe até hoje os peregrinos do mundo inteiro.

Atualmente a maioria das pessoais que realizam a peregrinação, não a fazem por motivos religiosos, eu mesma não fui motivada por isso. Entretanto, todos só consideram a missão cumprida após entrar na catedral, onde repousa os restos mortais de Santiago, e assistir à missa, se tiver botafumeiro, melhor ainda – incensário imenso que pesa 62 kg e mede 1,60m de altura e é tradição nessa Catedral – Não importa a sua crença, essa cerimônia vai tocar o seu coração. A emoção é indescritível, um misto de vitória, bênção e amor. Algo que jamais serei capaz de explicar.

O que é lenda, o que é fato, isso nós nunca saberemos, entretanto, eu posso afirmar que o Caminho é mágico e transformador. As vibrações de amor e ternura que os peregrinos recebem durante o caminho são regenerativas, não é terreno, é espiritual e muito forte, só entende quem fez. O fato é que um “simples” pescador, que em princípio parece ter falhado em sua missão de propagar os novos ensinamentos, hoje é responsável pela terceira maior peregrinação do mundo cristão, perdendo apenas para Roma e Jerusalém. Até hoje existem dúvidas se os restos mortais são mesmo de Santiago, mas quer saber? Isso é o que menos importa.

Ultreya, suseya y buen camino.

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